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Soluções Baseadas na Natureza para uma Agricultura Sustentável e Inclusiva

Qualquer sistema que tenha existido por milhões de anos antes de o primeiro ser humano sequer ter nascido tem algo de muito valioso a ensinar sobre viver em equilíbrio neste planeta. Nas últimas décadas, pesquisadores dos mais diversos campos do conhecimento vem prestando atenção às lições da natureza, na busca por soluções para alguns dos maiores desafios que a humanidade enfrenta na primeira metade do século XXI.

São soluções aplicadas ao paisagismo e urbanismo de grandes cidades, como jardins de chuva, parques lineares ou telhados verdes em casas e edifícios, que contribuem, por exemplo, para a permeabilidade do solo, a revitalização de cursos d’água e o combate a ilhas de calor. São ideias inspiradas no design natural de animais e plantas para o desenvolvimento de novos tecidos, embalagens, próteses, máquinas e soluções arquitetônicas, e até mesmo novas tecnologias de enfrentamento a pandemias – como as vacinas de RNA mensageiro contra a Covid-19, produzidas com a mesma técnica de edição genética que bactérias usam para se proteger de vírus.

E se a natureza tem tanto a ensinar em áreas tão distintas quanto essas, inspirando inovações que vão da moda à imunologia, não poderia ser diferente no campo onde, provavelmente, ela ofereceu ao ser humano suas primeiras lições: a agricultura. É de lá que vem um dos temas que a Fundação Bunge escolheu celebrar, neste ano, por meio da 67a edição do Prêmio Fundação Bunge: o tema das Soluções Baseadas na Natureza para uma Agricultura Sustentável e Inclusiva.

Tendo desenvolvido no último século tecnologias capazes de uma produtividade agrícola jamais imaginada por gerações anteriores – o que sem dúvida ajudou a alimentar bilhões, mas às custas de um consumo desenfreado dos recursos naturais e de enormes impactos ao clima e à vida na Terra –, a humanidade se vê agora obrigada a recuperar conceitos básicos da lida com o solo que nunca deveriam ter sido esquecidos, como conservação, diversidade e equilíbrio. É desses conceitos que se está falando quando se usa o termo “Soluções Baseadas na Natureza”, ou SBNs, aplicado à agricultura, para se referir a técnicas como rotação de culturas, integração entre floresta e lavoura, controle biológico de pragas ou o uso de bioinsumos como fertilizantes orgânicos, entre várias outras mais sustentáveis que o modelo de agronegócio disseminado globalmente no século passado.

Trata-se, ao mesmo tempo, de resgatar saberes tradicionais e elementares, mas também de produzir novos conhecimentos com a ciência mais moderna, para potencializar sua força e sua importância. Até porque, como nota o biólogo do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e membro do Conselho Administrativa da Fundação Bunge, Adalberto Luis Val, o desafio que se enfrenta hoje é planetário, mas se apresenta de forma distinta em cada parte do planeta.

“SBNs desenvolvidas na Rússia ou na China não servem aqui para o Brasil, assim como aquelas desenvolvidas em São Paulo não servem para o interior da Amazônia. Para cada microrregião, temos de encontrar soluções específicas”, diz o biólogo.

Para um país como o Brasil, portanto – de dimensões continentais, riquíssima biodiversidade e enorme potencial agrícola –, é preciso fomentar o trabalho de homens e mulheres que produzem ciência em todo o território nacional, e fazer essa ciência chegar a produtores de todas as regiões, numa disseminação democrática de saberes que não podem ficar concentrados nas mãos de poucos. E nem precisam, se forem baseados nos ensinamentos da natureza.

“As SBNs requerem mais a ação delicada do homem do que maquinário e investimentos pesados. Nesse sentido, elas podem ser utilizadas por agricultores familiares ou pequenos proprietários para produzir seus alimentos de forma mais controlada, com boa qualidade, numa escala menor”, diz Val, notando que as pequenas produções locais complementam o agronegócio de larga escala na economia nacional – “os dois níveis são necessários e não exclusivos” e que as SBNs são aplicáveis nos dois contextos, com grandes vantagens para o homem e para o meio ambiente.

Não é por acaso, aliás, a inserção do termo “sustentável e inclusiva” no tema do Prêmio Fundação Bunge deste ano, para qualificar a agricultura que se quer promover por meio das SBNs. Afinal, como explica a diretora executiva da Fundação Bunge, Cláudia Buzzette Calais, as mudanças climáticas não são o único grande desafio que o mundo precisa encarar atualmente. “Temos duas questões a enfrentar que nós mesmos, como sociedade, produzimos ao longo do último século: o aumento das desigualdades sociais e as mudanças climáticas. Promover a inclusão produtiva, ampliando a qualificação e o acesso de populações em situação de vulnerabilidade a emprego e renda dignos, por meio de agricultura regenerativa, de baixo carbono, é uma forma de enfrentar ambos os desafios”, diz a diretora, que cita como um bom exemplo de SBN aplicada à agricultura a criação de abelhas, útil não só como fonte de renda para pequenos apicultores, pela produção de mel, mas também como promoção do essencial serviço de polinização prestado pelos insetos.

Segundo Calais, a escolha do tema para o Prêmio Fundação Bunge busca, portanto, contribuir com a popularização de um conceito que pode ser a chave para um futuro melhor, ao abrir tesouros guardados há muito tempo, cujo valor tem de ser reapreciado. “Não basta mais quebrar recordes de produção de alimentos: precisamos de uma produção sustentável que respeite premissas básicas, e a natureza oferece soluções para isso. Na verdade, ela sempre ofereceu, nós é que havíamos deixado de prestar atenção nelas.”